terça-feira, 23 de setembro de 2008



O poeta descreve o que era naquele
tempo a cidade da Bahia.


A cada canto um grande conselheiro,
Que nos quer governar cabana e vinha;
Não sabem governar sua cozinha,
E podem governar o mundo inteiro.

Em cada porta um bem freqüentado olheiro,
Que a vida do vizinho e da vizinha
Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha,
Para o levar à praça e ao terreiro.


Muitos mulatos desavergonhados,
Trazidos sob os pés os homens nobres,
Posta nas palmas toda a picardia,


Estupendas usuras nos mercados,
Todos os que não furtam muito pobres:
E eis aqui a cidade da Bahia.


Nosso primeiro estilo literário foi o Barroco, podemos dizer que abrimos com chave de ouro. Gregório de Mattos (GdeM) foi um autor que intercalava entre o amor, a crítica severa ao governo, a poesia sacra e a crítica contra a igreja. Apesar de quase 500 anos, se fizermos uma assossiação com o contexto atual vemos que se encaixa direitinho. Na primeira estrofe GdeM faz uma daquelas críticas azedas a Portugal, que era a cultura dominante da época. Hoje Portugal não influencia tanto nossa cultura, mas temos outros colonizadores mais perigosos. Não saber governar sua cozinha não parece ser um impecílio para quem quer mexer na cozinha do outro. O efeito é natural, visto que não percebemos quando estamos sendo influenciados. Ao escolhermos uma roupa, ou o lugar onde lanchar, não repensamos o nosso lugar de preferência. Temos em nosso país uma quantidade absurda de marcas e indústrias comandando a economia de nosso país.


Agora vejamos os dois tercetos do poema: GdeM vivia no começo do regime escravista, era uma pedra no sapato daqueles que estavam metidos em escândalos no governo, principalmente na cidade da Bahia. Mas mesmo assim não podemos vê-lo como um santo, ou um salvador, pois o mesmo também era envolvido nesses escândalos. As marcas do trabalhador estão nas mãos, e quem mais trabalha não tem usuras, ou seja, não pode brincar. Agora experimente trocar a Bahia do último verso para Brasil ... chega a ser hilário.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008


Elegia ao suor


Eu chego, me calo

Deito-me na cama

Esvazio a cabeça

Você passa do lado fingindo indiferença e entendendo o que passo

Preparou o conjunto de peças de roupas pra desafiar o meu olhar:

Sempre perco

Num ato sem culpa

agarro tuas coxas, te faço boneca, te jogo pro alto como trapezista de circo.

Procuro teu seio buscando a energia que perdi durante o dia

Vejo a gota de suor que escorre da tua testa que desce o pescoço

Procuro tua boca nervosa onde vaza a saudade de um dia inteiro sem se ver

A língua percorre espaços que são sempre novos diante de um homem afoito como eu

Esqueço da briga passada que eu havia prometido a mim mesmo pedir desculpas

Depois que tudo termina permaneço quieto te cheirando sentindo calor

Escuto teus últimos sussurros de amor

Te olho novamente com olhos quietos felizes

A verdade é que não te perco nunca

A verdade é que não dá pra dizer

A verdade é que já sei como

Nem sempre precisamos

Nos falar ou calar

A verdade é que

AMO-TE

vero

quarta-feira, 17 de setembro de 2008


Lata d'gua(Luís Antonio e J. Júnior)Lata d'água na cabeça

Lá vai Maria

Lá vai Maria

Sobe o morro e não se cansa

Pela mão

Leva a criança

Lá vai Maria

Maria

Lava a roupa

Lá no alto

Lutando pelo pão

De cada dia

Sonhando com a vida

Sonhando com a vida

Do asfalto

Que acaba

Onde o morro principia


Postei essa música, porque tenho um carinho especial por ela. Apesar de simples, é uma música que me tráz uma recordação muito singular do lugar onde vivi. A cena que se remete na canção, foi muito comum ao meu olhos quando eu era garoto. No morro onde eu vivia ainda se dizia que a mulher era mais fraca que o homem. Na minha visão isso não é discutível, o homem não carregava a lata d'água, isso era um trabalho extremamente feminino.

Minha avó foi uma dessas Marias, sozinha criou 14 filhos, dos quais 2 morreram por doenças da vida. Ha pouco tempo achei uma fotografia na internet que foi o que fez me recordar dessa música e também recordar da minha infância. Das incanssáveis mulheres como minha avó, que lutaram por seus filhos e hoje são idosas sábias. Essa é entre outras uma riqueza do lugar onde eu vim. O Morro do Jacarezinho.